domingo, março 06, 2005

Diálogo de uma tarde de domingo

- Boa tarde.
- Boa tarde.
- Posso fazer uma pergunta ao senhor?
- Sim, claro.
- Como vai o senhor?
- Eu vou bem, obrigado.
- O senhor não pode ter me compreendido, eu quero saber como vai o senhor?!
- Eu já disse que vou bem.
- Conte-me sobre seus problemas. Você os tem?
- Claro, todos nós temos. Hum, deixe-me pensar, eu tenho uma filha grávida. Transou com um delinqüente e ele a engravidou.
- E o que o senhor pretende fazer com isto?
- Nada.
- Como assim nada?
- Eu pretendo fazer nada, o filho é deles, eles que se danem com ele. Eu vou fazer o que sempre fiz, cuidar de minha filha, desprezar o delinqüente, e seguir minha vida.
- Mas e a criança?
- Eles que cuidem dela.
- Mas sua filha, e o delinqüente tem modos de subsistência?
- Não sei, talvez eles agora passem a ter. Não me interessa.
- Tudo bem. E o que mais? Que outros problemas o senhor tem?
- Minha mulher não quer mais saber de transar comigo.
- Ah é? E o que o senhor pretende fazer com isto?
- Não sei ainda. Pensei estes dias em estupra-la, mas achei que não seria uma boa idéia.
- Por que não seria uma boa idéia?
- Ah, sabe como é, ela é minha mulher, afinal de contas, não posso trata-la como uma cadela ou uma puta dos vários cabarés que já freqüentei.
- E por que não pode trata-la assim? Só porque ela é sua mulher?
- Sim, você não é tão esperto quanto parece.
- Mas deve haver mais motivos para não trata-la assim.
- Há, rapaz; um dia eu amei aquela escrota, e isto eu respeito.
- Mas então que outra solução o senhor teria para que ela voltasse a transar contigo?
- Acho que vou ter que me desdobrar, ser carinhoso, dar presentes caros praquela safada interesseira, e você sabe, este tipo de coisa. Ou então desisto logo de vez e parto para os cabarés deste mundão doido aí.
- Certo, há algum outro problema?
- Que queira comentar não.
- Tem certeza?
- Sim. Alias, isto vai sair no jornal?
- Talvez.
- Então eu quero dizer praqueles malditos sem-terra saírem das minhas terras. As terras que eu lutei muito para consegui-las.
- E como o senhor as conseguiu?
- Ah, você sabe como é, né meu rapaz. Você é jovem mas não deve ser bobo. Eu ‘herdei’.
- Como assim ‘herdou’?
- Meu padrinho me passou uns esquemas aí de papeladas, burocracia e esse tipo de coisa. Aí eu ganhei umas terrinhas boas. Daí vem esses sujeitinhos preguiçosos e querem terra assim, de graça. Eles que vão para o quimba! Eu dei duro para movimentar toda esta papelada.Obrigado senhor. Tenha um bom dia.