quarta-feira, março 16, 2005

Hoje eu vi um filme.

Hoje eu vi um filme. Ele me fez ver que já existe geração abaixo da minha; que já existem outros garotos, com outros problemas, com outras idéias, e outras formas de burlar a realidade. Eu estou ficando adulto, e isso me incomoda, a adolescência me permitia uma sensação glamourosa, uma sensação central de atenção. Eu era distinto, melhor, diferente. A adolescência é uma fase onde as puerilidades se misturam organicamente com as velhacarias; é quando se sente o melhor e mais capaz do mundo, por ainda enxergar a inocência. É possível caracterizar isso, é possível tornar poesia, é doce viver, é doce sofrer. Mas depois tudo cessa, tudo muda. As pessoas se tornam opacas, indefinidas, e vão cada vez mais perdendo a vontade de caracterizar as coisas. Cada vez mais as pessoas tentam se apegar ao passado, e aí se tornam nostálgicas, ou esquecem de vez. Eu não quero mais ver qualquer filme, ler qualquer livro, ouvir qualquer música. Quero algo que mude minha vida, assim como mudava facilmente há algum tempo atrás. Mas minha vida já está bastante mudada, não sei se há mais como mudar, e é como se a cada mudança eu me engalfinhasse com a profundidade, e me emaranhasse mais e mais, sempre tendendo para baixo, ou para cima, dependendo do ponto-de-vista. O certo é que não há volta. As mudanças são irredutíveis, e também inevitáveis. Não dá mais pra protelar a responsabilidade, não da mais pra protelar a mediocridade de espírito. Não sei o que ainda pode ser feito. Talvez eu deva aceitar tudo e seguir cabisbaixo. Talvez eu deva assumir a responsabilidade adulta de modo distinto, como eu achava que seria, na fase resplandecente. Mas agora não é assim, encarar as vicissitudes da vida não é assim coisa fácil. Eu quero mudar minha vida então, mais e mais vezes, sem parar, até encontrar o ponto ideal, a experimentação perfeita. Os filmes são belos, eles mudam as vidas de pessoas como eu. Queria viver como em filmes, ter a coragem e a audácia dos personagens, encarar as contingências com a naturalidade peculiar deles. Viver absorto em uma película de filme preto-e-branco, sem cores fortes e ofuscantes, sem problemas da vida comum, sem rotina doentia. Eu amo a vida, e vou fazer dela um filme; meu filme predileto.