quinta-feira, junho 02, 2005

Impostor documentarista.

Impostor documentarista banal/sarcástico/visceral/transcedental/verdade-bonito.
Esses dias conversei com o Paulo Tatu, que me contou sua história. Não sei se interessa muito, mas o negócio é o seguinte: Ele é um velho de cinqüenta e três anos, que bebe desde os sete. E com orgulho. Perguntado sobre sua iniciação, disse-me sem desfaçatez: “Quando criança, sentia dor nos dentes, pedi pra mamãe que fizesse algo. Deu-me uma solução ‘fedendo’ a álcool, me mandou bochechar pra depois cuspir. Porra, mas aquilo me pareceu bom, aí eu bochechei e engoli, reah, e foi louco, desde então nunca mais parei”.

Sim, seu Paulo Tatu é mais um dos personagens dessa sub-vida que vivo e sobrevivo com descaramento todos os dias.

Eu vejo filmes documentários, e eles fazem bonito a favela, transformam em tragédia grega valorizada as estórias de gente que nunca saiu daquele inferno, gente que foi concebida, nasceu, cresceu, ‘bohemiou’, bebeu, fumou, lutou, enxugou, matou e morreu por ali. É uma nudeza factual sem precedentes, e isso é a pauta, o que mais impressiona.

Não tendo opinião formada sobre esses arautos da informação periférica, marginal, ou submundesca, quer como seja, eles me mostram o mundo das ‘trevas’ com lirismo crú, dolorido. É inaudito pra vocês? Pra mim não, pois enxergo essas entrelinhas nefandas até no embusteiro programa da Xuxa (ela tá até no dicionário do “Palavra” da Microsoft), e eu absorvo, claro, é uma obra de arte, verossímil ou não, coerente ou não!. Quer discutir sobre a coerência de todas as obras de arte da humanidade?!! Então se prepare. Brincadeira.

Documentaristas, regulamentados ou não, com festivais representantes ou não, vocês estão transcendendo seus domínios, suas necessidades, suas propostas e seus objetivos. Estão doendo mais do que deveriam, estão perturbando mais do que cegos cacofônicos do interior desorientados pelas vitrines (inclusive vivas) das urbanóides, estão batendo no peito e fazendo sentir no fígado com a bílis mais cáustica de todas. E eu gosto de saborear o aclamado “spleen” do século dezoito/dezenove, bílis pra nós enfermos. Vão em frente e fodam com o universo, fazendo filme daquelas pessoas que nem sabem se vivem como deveriam viver. E isso talvez seja viver.

Tiago Muzulon.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

hilária essa iniciação do Tatu.
lembro-me quando criança, entre cinco e sete anos, estava de férias na casa de meus avós. meu avô, pescador, estava preparando o peixe e fez uma caipirinha que em seguida pediu que levasse até meu pai, que estava em outra parte da casa. meu pai bebericou e mandou levar de volta. no meio do caminho parei curioso, olhei o copo e entornei gargata abaixo. fiquei de porre, o primeiro de muitos.

10:11 AM  

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